SETORIZAÇÃO: ESPAÇO DE PROTAGONISMO

Estamos para celebrar os dez anos da V Conferência de Aparecida, que aconteceu em 2007. Esta foi, sem dúvida, uma das mais belas experiências eclesiais pós-conciliares que já houve depois do Concílio Vaticano II. A América Latina foi agraciada com cinco destes eventos. Um, antes do Concílio (Rio de Janeiro) e quatro depois (Medellín, Puebla, Santo Domingo e Aparecida). A leitura das conclusões destes momentos é obrigatória para quem quiser sentir o caminhar da Igreja latino-americana nestes últimos tempos.

Tirando a primeira, as demais não podem ser entendidas e interpretadas sem a leitura dos dezesseis documentos conciliares. É imprescindível, não só os quatro principais, a saber: Lumen Gentium, Gaudium et Spes, Sacrossantum Concilium e Dei Verbum, mas todos os demais. Na introdução do sétimo volume das Obras Completas do teólogo Ratzinger, ele menciona a importância da Dignitatis Humanae, justamente sobre a Liberdade Religiosa, tema tão relevante nos dias atuais. Isso para dizer que há referenciais teológicos e eclesiais ainda a serem explorados dos ensinamentos conciliares. A Europa pensou as linhas mestras do Concílio; todavia, a América Latina, com o protagonismo pastoral dos seus padres conciliares, com uma aplicação contextualizada, inclusive com a opção feita no Pacto das Catacumbas, é quem mais avançou na consecução das propostas e orientações pastorais. Até uma teologia contextualizada surgiu, como em outras partes do Mundo, a chamada “Teologia da Libertação”. Aqui me vem em mente, necessariamente, a obra fantástica e de necessária leitura para os estudantes de teologia da América Latina: Teologia de la Liberacion, (Gutierrez, G.).

Neste período também surgiram as Comunidades Eclesiais de Base, que eram as experiências eclesiais que aconteciam na vida das comunidades de base, tendo como referenciais o uso da palavra de Deus, o protagonismo dos Leigos e a espiritualidade da religiosidade popular, tão arraigada na cultura do povo latino-americano. Na “Redenptoris Missio” (N. 50) o então Papa, João Paulo II, reconhece o valor desta experiência eclesial e o seu bem para vida da Igreja na América Latina. A infiltração e manipulação políticas destas células geraram interpretações espúrias e causaram um preconceito pueril acerca da importância destas autênticas expressões eclesiais tão importantes para o fortalecimento da Igreja em nosso contexto, infelizmente.

A V Conferência resgata a importância desta experiência, via a necessária “Setorização Paroquial”. O fim desta reorganização territorial da realidade geográfica e existencial da paróquia é a formação de pequenas comunidades, onde basicamente a vivacidade dependerá do protagonismo maduro, comprometido e eclesial de todos os ministros e fiéis que compõem a vida da comunidade paroquial. A expressão e prática sem as quais essa postura missionária não terá êxito é “Conversão Pastoral”. Todos somos chamados a essa mudança paradigmática e programática, como lembrou o Papa Francisco aos Bispos do Celam, no Rio de Janeiro, na Jornada Mundial da Juventude. Parece que muitos esquecem, que eles mesmos construíram esse magnânimo projeto. A Setorização paroquial é a via para que seja encaminhada a ação desta Igreja em saída missionária e permanente.

Os setores missionários não podem ser realidades eclesiais institucionalizadas, mas meios de presença da Igreja nos espaços e na vida das pessoas, que não foram evangelizadas. Oxalá, sacramentalizadas, mas não lembradas e acolhidas como filhas da Igreja no decorrer de seu processo de Evangelização. A presença dos ministros ordenados é pastoral, misericordiosa, acolhedora, paterna, ou materna, quando as religiosas estiverem envolvidas, formativa, animadora, alegre e afetuosa. Os sacramentos, principalmente a Eucaristia e a Confissão, são fonte de fortalecimento e conforto misericordiosos. Não podemos esquecer: devemos estar onde nunca fomos, sentindo, como o Papa Francisco nos pede, “o cheiro das Ovelhas”.

Por fim, que Deus nos fortaleça com o sopro do seu Espírito, para que saíamos do nosso comodismo atávico e cíclico, fazendo com que as paróquias, que não são estruturas caducas, como nos lembra o Papa Francisco, sejam realmente vivas e verdadeiras Família das famílias. A Setorização pode contribuir muito com essa renovação se for bem entendida e implantada como prioridade na organização missionária pastoral de todas as paróquias das Arquidioceses, ou Dioceses, do nosso Continente Latino Americano. Com a Setorização, precisamos chegar a ser Comunidades Eclesiais de Base, onde o protagonismo do povo de Deus, orientado pela Palavra, fortalecido pela mistagogia sacramental, que nos deifica, e ação encorajadora do Espírito Santo, que santifica, formando a comunhão eclesial, com ministros ordenados, religiosos(as) e todos aqueles que acreditam na concretização do Reino de Deus, aqui e agora, rumo a esta realidade definitiva. Vamos assumir a missão permanente. Assim o seja!

Por Padre Matias Soares
 Arquidiocese de Natal
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