A NECESSIDADE DE RETIRAR-SE

Por Pe. José Lenilson de Morais, Vigário Paroquial de São José de Mipibu.

DSCN1749Os presbíteros da Arquidiocese de Natal farão próxima semana seu Retiro anual. Quando falamos em retiro espiritual temos que vê-lo como uma oportunidade para “ficar com Cristo” num lugar a parte: “Jesus estava rezando num lugar retirado, e os discípulos estavam com ele” (Lc 9, 18). Fazer retiro espiritual não é algo fácil, principalmente nos dias atuais quando somos cercados de todos os tipos de “ruídos” e onde podemos projetar sobre nós mesmos os holofotes das redes sociais com suas “curtidas” a cada segundo.

Quem quer perder a última notícia sobre os protestos no Brasil? Quem não deseja dar sua opinião para as centenas ou milhares de amigos do Facebook? E as fotos dos amigos distantes, dos familiares, das viagens etc. Além disso, o retiro supõe encontro, o que gera o desejo de saber como o outro estar, de compartilhar suas alegrias ou de apoiar alguém em suas dores. Parece-nos um atraso também ficar distante uma semana de nossas atividades cotidianas, e assim por diante.

Diante de tudo isto é que se faz mais premente o “retirar-se para um lugar deserto”. Deus nos fala a todo tempo e em qualquer lugar – não podemos limitar a ação de Deus – mesmo em meio a uma multidão agitada, contudo há uma predileção de Deus por dialogar no deserto, isto é, onde há silêncio. Os escritores espirituais – sobretudo os santos – são testemunhas irrefutáveis da necessidade de parar para ouvir a voz de Deus. Um exemplo emblemático é o do profeta Elias: “O Senhor desse a Elias: “Sai e conserva-te em cima do monte na presença do Senhor: Ele vai passar. Nesse momento passou diante do Senhor um vento impetuoso e violento, que fendia as montanhas e quebrava os rochedos; mas o Senhor não estava naquele vento. Depois do vento, a terra tremeu; mas o Senhor não estava no tremor de terra. Passado o tremor de terra, acendeu-se um fogo; mas o Senhor não estava no fogo. Depois do fogo ouviu-se o murmúrio de uma brisa ligeira. Tendo Elias ouvido isso, cobriu o rosto com o manto, saiu e pôs-se à entrada da caverna. Uma voz disse-lhe: Que fazes aqui, Elias?”(I Reis 19, 11-13). Elias fugia e, ao mesmo tempo, se consumida de zelo pelo Senhor porque os israelitas haviam abandonado a Aliança. Elias deveria retornar ao mundo para preparar seu sucessor Eliseu, porém no meio da confusão ele não conseguia ouvir e entender a vontade de Deus. Se fosse hoje talvez pudéssemos dizer: Elias amava muito a Deus, o servia de todo coração (zelo), mas o ativismo o havia desgastado e consumido sua energias espirituais. Ele precisava de um tempo, de um retiro, de uma terapia (“brisa suave”) para poder ouvir com mais clareza: “que fazes aqui Elias?” Notemos que Deus não pergunta: quanta coisa fizestes aqui, Elias?, mas “o que fazes aqui?”A atenção de Deus durante o retiro de Elias na gruta e na montanha é para o seu profeta, não para suas atividades. Só depois é que o Senhor lhe dirá: “Retoma o caminho do deserto, na direção de Damasco. Ali chegando, ungirás Hazael como rei da Síria, Jeú, filho de Namsi, como rei de Israel, e Eliseu, filho de Safat, de Abel-Meula, como profeta em teu lugar” (I Reis 19, 15-16).

A pergunta “que fazes?” nos lembra uma outra feita por Javé-Deus a Adão: “onde estás?” ( Gn 3,9). O retiro deve ser encarado como uma oportunidade para respondermos a estas duas questões antropológicas fundamentais: “O que é o homem, e o homem de Deus?” e “onde ele está, o que faz de sua vida?”. Se tivermos a coragem de “entrar no quarto e fechar a porta” de madeira, do smartphone e, principalmente, do coração para o “fogo”, a “ventania”, o “terremoto” do mundo exterior, certamente poderemos retornar a ele mais revigorados para cumprir nossa missão de sacerdotes e profetas. Ao contrário, nada adiantará o tempo e o dinheiro empregados, pois quem não se enche de Deus – na intimidade com Cristo – pode falar muito, mas comunica pouco. Que Deus nos ajude a todos!

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