Por Rejane de Souza.
O tempo de infância cheio de pequenas surpresas, inusitadas descobertas… Um ambiente de magia, de superstições, de histórias de um mundo maravilhoso, contaminado por lobisomens, caiporas, de mulas sem-cabeça, de papa-figos; príncipes encantados, botija de ouro, galinha de prata. Na mente infantil, esse universo vinha sempre misturado por lendas e personagens reais. Tal cenário, com a ausência de luz elétrica, tornava o mundo tão absurdamente real, que a imaginação dos pequenos corria solta, livre, inocente, sem medo de sonhar, de fantasiar… Um tempo em que se podia dormir cedo, acordar com o canto dos galos. A única diversão noturna era a de ouvir histórias contadas pelos avôs ou pelos pais, brincadeira de rodas, adivinhas e outros motes populares. Além dessa aprendizagem, havia outros maiores ensinamentos vindo da natureza, da força da lua, que indicava o tempo de plantar e o tempo de colher; o conhecimento sobre as plantas medicinais que havia nos quintais ou na área de mata. Provido da sabedoria popular, o povo, naturalmente, diferenciava as plantas do bem, outras, do mal. Aprendia-se, também, com os cantos dos pássaros. Uns adivinhavam chuva, outros alertavam para acontecimentos inesperados, sobrenaturais. E existiam, ainda, os que cantavam para harmonizar os homens com a natureza.
Nesse tempo, a natureza era a parceira e amiga dos homens. E as frutas se ofereciam como banquete para as crianças, que subiam nas árvores para colher mangas, goiabas, abacates. E aguardavam ansiosas, pela safra das frutas silvestres. Um espetáculo à parte, além da aventura de desbravar a área de mata, os tipos de frutas colhidos eram dos mais diversificados: os vermelhinhos camboins, as amarelinhas ubalhas, os transparentes bons de galo, as guabirabas em tons vinhos. Não se tratava de saciar a fome, o ritual representava, para as crianças, uma grande brincadeira. O contato direto com as plantas e frutas era contagiante, harmonioso. A travessia era realizada na companhia de um adulto que indicava as veredas e os seus saberes sobre cada árvore, cada fruta, cada canto. Um mundo propício à criação e imaginação.
O tempo adolescente de questionamento e dúvida. Em outro espaço, a difícil convivência com os adultos. Fase confusa, turbulenta. As inquietações sobre as transformações do corpo. As espinhas que resistem aos mais diversos cremes. A indefinição da letra, a busca por um modelo de vida, de roupa, de uma filosofia… Os sonhos, as utopias sobre o amor que demoram a chegar. A fase introspectiva alimentada pelos próprios sentimentos. O medo de dividir as dúvidas e as poucas certezas. O mundo bucólico ficou para trás. A realidade chega através das pequenas frustrações, pelo amor platônico. Outras vezes, pela incompreensão dos adultos, pela traição dos amigos. As descobertas são outras no mundo urbano. Descobertas humanas, quase sempre penosas, para quem viveu nos limites do universo do campo. A necessária convivência com a dor dos conflitos familiares, com sentimentos de competição, inveja, com as regras socialmente estabelecidas, nem, por isso, coerentes. Um doloroso aprendizado. Experiências que lapidam o ser, mas não a sua essência.
A jovem fase. A busca do equilíbrio interior. Metas a serem atingidas. Espaço universitário. Aberturas de portas e janelas para novos mundos: das idéias, das consciências, da autonomia, do conhecimento social, político e humano. Ambiente efervescente: cultura, música, poesia… O encontro do ser com ele mesmo. A desejada liberdade dos pássaros, da fala, do pensamento. Os livros são o limite. O ser humano, a companhia mais preciosa. As trocas de experiências, a travessia mais radiosa. O conhecimento, a arma mais poderosa para nos libertar. Mas a vida corre como um rio. Acompanhá-la é nosso grande desafio.
Rejane de Souza é ensaísta e poeta. Uma de suas poesias foi selecionada e publicada na coletânea “Nova Poesia Brasileira” pela editora SHOGUN ARTE- Rio de Janeiro em 1996. Além disso, já publicou ensaios literários no caderno de Cultura da Tribuna do Norte, Jornal de Hoje, O Mossoroense. O Noticiart de Campina Grande/PB e Na revista Preá da Fundação José Augusto-Natal/RN. As suas poesias figuram no site Mural dos Escritores: https://www.muraldosescritores.ning.com/ sempre no ranking dos textos mais lidos, tanto por leitores brasileiros quanto portugueses.
Rejane de Souza também é membro da Union Hispanamericana de Escritores. E no portal foi agraciada pelo amigo escritor e poeta Marco Augusto Gonzalez Almeida – Natural de Maracay – Aragua – Venezuela – que fez a tradução de sua poesia para a língua espanhola.
Deixe um comentário